Superação do racismo estrutural é tema de webconferência promovida pelo TCE-RS
25 de junho de 2020 - 15:45
Nesta quinta-feira (25), o TCE-RS, por meio da sua Escola Superior de Gestão e Controle, promoveu a webconferência “Racismo Estrutural: do entendimento à superação”, debatendo sobre a discriminação racial reproduzida sistemicamente na sociedade e nas instituições, através dos canais do TCE-RS no YouTube e no Facebook. A iniciativa contou com a participação da promotora de Justiça do Ministério Público da Bahia, Lívia Sant’Anna Vaz; e do desembargador federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) Roger Raupp Rios e foi mediada por Gleidson Renato Martins Dias, assessor especial da presidência na área de Direitos Humanos.
O presidente do TCE-RS, Estilac Xavier, ao saudar os convidados, sustentou que os tribunais de contas deveriam, também, averiguar a qualidade dos gastos públicos para a garantia de direitos, para a promoção da igualdade e para o combate ao racismo: “É a partir deste entendimento que o Tribunal de Contas gaúcho prepara um plano antirracista que, para além de combater a discriminação e a exclusão racial dentro da própria instituição, pretende agregar os Poderes e demais órgãos do Estado e dos Municípios para o mesmo desafio”, disse.
A promotora de Justiça Lívia Sant’Anna Vaz fez um resgate histórico, político e jurídico da construção do racismo estrutural no País, passando pela conotação racial da escravização, pela construção do aparato estatal que legitimou a subjugação do povo negro – inclusive após a promulgação da Lei Áurea –, e pelo atual papel do Estado na perpetuação do racismo. Para ela, desde a colonização do Brasil, estabeleceram-se padrões de privilégio ao homem branco na construção do Direito. Citou, como exemplo, o longo período em que os negros tiveram negado, por Lei, o direito de frequentar os bancos escolares no Brasil. “As políticas de cotas tentam recuperar esse tempo perdido, como uma forma de compensação na tentativa de equiparar as condições de acesso entre negros e brancos”. Também exemplificou as “políticas de embranquecimento” incutidas nos discursos e na legislação, com a proibição de entrada de africanos e asiáticos no Brasil, salvo autorização do governo, em contraste com a facilidade de entrada que tiveram europeus, que eram contemplados com acesso a direitos e vantagens para a imigração. “Sempre houve a criminalização do povo negro por meio de mecanismos legais, como no caso da legislação persecutória a religiões de matriz africana, que pretende que o povo negro rompa com suas raízes”.
Lívia também apontou os dados do Atlas da Violência 2019 que refletem o quanto a violência contra mulheres, os homicídios, a mortalidade infantil e o feminicídio são fenômenos que atingem majoritariamente a população negra. “A análise histórica confirma que não se trata do genocídio da juventude negra, mas do povo negro”, afirmou. Com relação ao racismo institucional e os privilégios da branquitude, ela lembrou que, mesmo depois da Lei Áurea, a questão raça continua determinante para todas as diferenças sociais no Brasil. “É a reprodução, pelas instituições públicas e privadas, da hierarquização das pessoas em função da raça e da cor da pele. É notória a sub-representação de negros em cargos de comando, seja nas instituições estatais ou privadas, no sistema de Justiça ou nas universidades. Somente a diversidade dos quadros garante pluralidade de visões”. Para ela, a superação do racismo passa por ações concretas, como o estabelecimento de políticas institucionais que promovam a representação das pessoas negras, a fiscalização das políticas públicas de promoção da igualdade racial (como cotas raciais, implementação das leis 10.639/2003 e 11.645/2008), a improbidade administrativa por desvio de finalidade, o enfrentamento ao racismo religioso e o respeito ao Estado laico.
Já o desembargador Roger Raupp Rios discorreu sobre o conceito de racismo estrutural e sobre as suas diferentes formas de manifestação. “Quando falamos em racismo estrutural, estamos tratando do modo de organização da sociedade, que incorpora conceitos de hierarquia social, provocando diferenças de oportunidades. Trata-se de uma discriminação que se manifesta de forma difusa, que já faz parte do imaginário social e vai muito além de manifestações pontuais de discriminação”, avaliou. Para Raup, “os padrões de conduta e de mentalidade das instituições e organizações forjam a mentalidade e as percepções de todos nós. É assim que se estabeleceram o racismo e o sexismo, por exemplo. Não devem ser considerados apenas como desvios individuais, mas de grupos, de estruturas, que moldam os sentimentos e percepções de cada um de nós”, disse.   “Se o racismo é estrutural, os remédios devem ser estruturais. É na sociedade, na escola, nas igrejas, nos movimentos sociais que se deve quebrar o ciclo, percebendo as assimetrias”.
Raupp falou, ainda, sobre a dimensão moral do racismo que deforma os sentimentos e as percepções de justiça. “O racismo não é só um problema político, econômico ou social, mas, principalmente, moral dos indivíduos e dos grupos. É preciso romper a cegueira e o continuísmo, e isso vai muito além do cumprimento de preenchimento de cotas. Os órgãos de fiscalização e controle devem incluir, no item avaliação das políticas públicas, o impacto que eventuais medidas causam nos grupos raciais étnicos considerando os princípios de moralidade, eficiência, legitimidade e eficácia das políticas públicas”, concluiu.
Assista aqui a íntegra da webconferência.
Letícia Vargas – Assessoria de Comunicação Social
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Audiodescrição: A imagem é dividida em cinco retângulos, cada um mostrando o rosto de um dos participantes da webconferência (fim da descrição).